2009-11-26

PR15 - Desafio Lousã - 21 de Novembro de 2009





Relato do PL

«Por onde começar um dia épico de BTT na Lousã?

As memórias estão todas ainda bem presentes e todas querem saltar para a ribalta e ter protagonismo. O melhor é tentar organizar as ideias antes de começar a escrever.
Isto é capaz de ficar longo...

O desafio estava traçado há mais de uma semana: oito artistas iam fazer o PR15, percurso de BTT que se inicia em Ferraria de S. João sobe a Serra da Lousã em direcção a Gondramaz e depois de umas voltas lá no topo inflecte para Sul em direcção a Figueiró dos Vinhos, para depois de umas voltas lá por baixo seguir para S. Simão, terminando novamente em Ferraria de S. João.

Just4Funners eram 3 (SD, JP e PL) que se juntaram ao Pedro Cravo (PC), Leonel Rodrigues (LR), Sónia Martins (SM), David Portelada (DP) e Pedro Roque (APRO) para desafiarem a Serra no dia 21 de Novembro de 2009.

A dormida foi já na Lousã de Sexta para Sábado na Pousada da Juventude e, como estava prometido, a noite foi tudo menos o que se aconselha na véspera de um percurso destes. Ao vinho do PC juntou-se pão saloio, chouriço assado, queijo e muita conversa, pelo que só bem depois da uma da manhã é que recolhemos aos beliches. A primeira foto atesta a combinação estranha que estava em cima da mesa.A alvorada foi cedo, porque a partida estava marcada para as 8:00, já com o pequeno-almoço tomado e logo aí começou a aventura de escolher a indumentária adequada ao que tínhamos pela frente. Estava prometida chuva e vento, mas a verdade é que não chovia e não estava muito frio, pelo que optei por um traje mais light, embora enfiasse um impermeável no bolo da camisola (just in case). Com preparativos e reforço alimentar, que o da Pousada foi fraquito, só às 8:36 é que começámos a pedalar.

Como se o desafio do PR15 não tivesse já dificuldade suficiente, decidimos partir de bicicleta directamente da Lousã, apanhando o percurso a meio, lá no alto da serra. Acrescentámos assim quase 800 m de ascendente aos já respeitáveis mais 2000 m que o percurso prometia. Apesar de tudo esta subida, que decorreu entre o km 2 e o km 13 e durou perto de 1:30, fez-se bem, com um ritmo contido porque ainda havia muito que pedalar pela frente. Apesar do vento não houve chuva até lá acima, onde se fez uma pausa e toda a gente se protegeu porque se anteviam algumas descidas. Até ao km 22, onde se atingiu a cota mais alta andámos num sobe e desce em torno dos 900 metros de altitude, iniciando por volta das 11:11 a fase maioritariamente a descer que nos levaria até ao extremo Sul do percurso. Por volta das 12:10, ao km 36, chegamos ao túnel que atravessa o IC8 e aproveitamos para reagrupar, comer, tratar de pequenos detalhes do material e avaliar o que fazer. O túnel era o abrigo perfeito para a chuva incessante que começava a fazer mossa. Quatro de nós decidem seguir uma parte do percurso por asfalto até Ana de Aviz, onde nos voltaríamos a encontrar. Os restantes quatro (SD, JP, PL e APRO) permaneceram fiéis ao trilho.
Quando encontrámos a outra metade do grupo estavam parados num café com lareira e desafiaram-nos para entrarmos. A proposta era tentadora, mas eles disseram que seguiriam para a Lousã por asfalto, e nós queríamos continuar no trilho. Resistimos à tentação de entrar e decidimos continuar para almoçar um pouco mais à frente.

Por esta altura a minha corrente começou a ser “chupada” pela pedaleira pequena sempre que necessitava dela. As subidas começaram a ser massacrantes porque a cada duas pedaladas para a frente tinha que dar uma para trás. Muitas vezes tive que desmontar por causa disso, o que além de reduzir drasticamente o ritmo do grupo me começava a chatear seriamente. Lubrifiquei diversas vezes e a coisa melhorava durante algum tempo, mas rapidamente voltava à mesma.

Foi com alívio que chegámos a Ribeira de Alge e entrámos no primeiro estabelecimento de restauração que encontrámos, que até tinha um telheiro onde podíamos abrigar-nos da chuva. O lugar era espectacular pois esta varanda estava mesmo sobre a ribeira e junto à ponte que tínhamos acabado de atravessar. Preparávamo-nos para ficar pelo alpendre, mas assim que nos viram disseram-nos logo para entrar e para nos chegarmos à lareira. A vontade era muita, mas não queríamos sujar tudo à nossa passagem. Puseram-nos logo à vontade e que não tivéssemos problemas em sujar. Aproveitámos a oferta e logo ali tentámos secar um pouco as luvas e mais algumas peças de roupa para nos sentirmos melhor quando fôssemos reiniciar a pedalada.Demorámos uma hora no local, a degustar um creme de cenouras quentinho, e umas bifanas grelhadas que estavam espectaculares. Para as bebidas as opções foram diversas, desde a imperial à cola, até ao chá verde, que o tempo estava bom era para beber coisas quentinhas. Obviamente quem optou pela bebida mais quente (como foi o meu caso) não evitou umas piadolas à “Contemporâneos”, mas ainda assim a opção foi acertada. Fiquei com vontade de lá voltar noutras condições menos agrestes, para poder usufruir da localização, da simpatia e das especialidades (peixe do rio e carne). Para que conste, aqui fica o contacto: http://www.restauranteribeiradealge.com
Se passarem por lá digam-lhes que chegámos bem à Lousã :-).Não consigo descrever o que custou sair da frente da lareira para a chuva que não abrandava, mas o que tinha que ser tinha muita força e lá vamos nós na direcção de S. Simão.

Os quilómetros seguintes foram feitos ao longo da Ribeira de Alge que atravessámos numa ponte meio destruída, inclinada e com a madeira encharcada que escorregava mais que manteiga em frigideira quente. Com muito cuidado e algumas escorregadelas menos controladas lá chegamos à outra margem, onde nos esperava uma subida pelo meio de rochas e calhaus em que tivemos que levar as meninas ao colo ;-).

Continuou-se a subir e bem até S. Simão, onde se fez uma paragem minúscula, mas que deu para nos apercebermos da beleza da povoação. Mais uma marcada para regressar com mais calma. Seria desnecessário, mas ainda assim refiro que continuamos essencialmente a subir até Ferraria de S. João, onde chegámos às 16:43 e com 65 km. A média estava miserável: 65 km em mais de oito horas, com 15 km nas últimas duas. Mesmo considerando uma hora para almoço e mais de vinte minutos no túnel, é uma média ridícula, mas eu não tinha condições para fazer melhor.

Era a altura da grande decisão: regressar à Lousã por asfalto ou voltar a enfrentar a Serra?

Consultou-se o mapa do centro, que não deu grande ajuda. Consultaram-se as memórias difusas de uns e outros e a cartografia do GPS. Conclui-se que a distância seria equivalente nas duas opções, mas o caminho mais curto em asfalto seria por um IC, onde, em princípio não poderíamos andar, o que tenderia a aumentar a incerteza e distância por asfalto. Por outro lado, pela serra sabíamos o que nos esperava (pensávamos nós) e não havia o risco de pedalar à noite em condições de visibilidade reduzida numa estrada com carros a grande velocidade. Optou-se pela Serra.

Com os preparativos nem deu para apreciar devidamente as instalações do centro, mas o alpendre e a casa de banho deram um jeitão. Há que regressar com a devida calma.

Após cerca de trinta minutos nesta paragem fizemo-nos à subida que nos voltaria a levar à cota 900, agora com as luzes ligadas, que a noite já caía.

Da subida não há muito que contar a não ser que esperava que fosse mais complicada, o grupo dividiu-se a meio e agrupamos em S. João do Deserto, seguindo com alento renovado pela cumeada até que o SD repara que tem um furo. Não há alturas boas para furar, mas aquela, de noite, molhados e com frio, era das piores. Felizmente o SD lembrou-se que tinha uma lata de spray anti-furo que aplicou e funcionou. Foi um alívio para todos, mas especialmente para ele.

Entretanto tinha parado de chover, mas no topo da serra o vento fazia-se sentir com mais intensidade. A atmosfera agora limpa permitia-nos algumas vistas de que não tínhamos usufruído durante o dia. Não sei se foi da distracção com as vistas ou da pouca concentração provocada pelo frio e cansaço, mas falhámos um desvio do percurso, seguindo num estradão ao lado. Quando o estradão virou à esquerda e o trilho não, interpretámos que seria para seguir em frente. Havia uma espécie de caminho mas em péssimo estado, pelo que decidimos tentar subir no estradão mais um bocado para ver se apanhávamos o trilho mais à frente. Entretanto as diferenças de andamento a subir eram notórias. Apercebi-me que nos estávamos a afastar muito do trilho e a subir para uma cota muito acima da que era esperada, mas não tinha como avisar os da frente que não tinham GPS. Fui subindo devagar até que quase no topo acabámos por reagrupar. Foi um momento delicado. Soube depois que o grupo tinha ficado completamente esfrangalhado e mesmo sem contacto visual entre os elementos, alguns dos quais (os da frente) sem GPS. Não havia muitas hipóteses de sair do estradão, mas mesmo assim não é agradável ficar sozinho na serra naquelas condições.

Reagrupados e com a informação que o estradão continuava em bom piso depois de atingir o topo (o SD já lá tinha ido e voltado), decidimos continuar e verificar se de facto conseguíamos encontrar o trilho, o que acabou por acontecer. Nessa altura voltámos a discutir as opções e a mais lógica seria tentar encontrar o caminho mais rápido para a Lousã. O estradão onde estávamos era de serviço às eólicas, pelo que devia ter ligação a uma estrada algures. O bom piso também ajudou na opção e andámos cerca de um quilómetro nele, sempre controlando a direcção em que nos levava. Pareceu, no entanto, que se afastava do nosso objectivo e arriscávamos a ir parar a um vale na vertente contrária da serra, pelo que voltámos a discutir as opções e decidimos voltar atrás e seguir o trilho até Gondramaz. Aí podíamos pedir indicações para a Lousã, porque havia estrada de certeza.
Deste estradão ao longo das eólicas ficam sensações que não consigo descrever, conjugando o som das pás a assobiar na atmosfera com as luzes a piscar ora claramente visíveis ora escondidas no meio das nuvens num ambiente com algo misterioso.

O caminho até Gondramaz, sempre a descer, não teve história, fizemo-lo com cuidado para não termos surpresas, dado que o piso era irregular. À chegada à aldeia encontrámos duas pessoas que não nos sabiam dar indicações, porque não eram de lá, mas nos forneceram uma indicação preciosa: tinha acabado de vir de Miranda do Corvo.
Isso queria dizer que havia estrada :-) .
Entrámos na aldeia e encontrámos uma senhora muito simpática a quem perguntámos o caminho para a Lousã. Para nosso espanto indicou-nos o trilho do PR15, ora esse sabíamos nós que não queríamos seguir. Pedimos um mapa e disse-nos que tinha um no café. Bingo! Mapa num café queria dizer que podíamos ingerir algo quente enquanto o consultávamos. Seguimo-la e verificámos que o mapa não estava “no”, mas “junto” ao café, num painel de informações para os caminhantes. Era de utilidade nula, uma vez que apenas referia os percursos pedestres da zona. Entrámos no café (que também era restaurante) e pedimos galões e chocolate quente. Não resistimos à proposta de ingerir umas sobremesas, tendo as opções sido mousse de chocolate e tigelada. Eu comi a tigelada que estava óptima, mas quem comeu a mousse diz que também estava muito boa. Aproveitámos a pausa para organizar as ideias e voltar a vasculhar a cartografia do GPS. Encontramos a referência de três aldeias próximas sabendo que na última passava a EM555 que nos levaria à Lousã. Reformulámos a questão e perguntámos pela estrada que nos levaria a estas aldeias e a resposta já nos agradou, confirmando que era por onde nós pensávamos ser.Terminado o repasto já com alguns clientes no restaurante prontos a jantar era tempo de nos fazermos à estrada. Um obrigado e adeus à senhora e aos clientes (dois dos quais eram as primeiras pessoas que encontrámos na aldeia) que nos desejaram boa viagem e devem ter ficado a pensar que éramos malucos.
Isto mesmo pôde confirmar o APRO que lá regressou para almoçar no dia seguinte. A senhora não o reconheceu, então “à civil”, mas não deixou de comentar para quem o acompanhava que ele era maluco :-) .

Como referência, porque gostamos de publicitar os locais onde somos bem tratados, ficam os contactos do local: Pátio do Xisto – Turismo em Espaço Rural, Lda – http://www.patiodoxisto.pt
Mais um local a revisitar com mais tempo.

Os quilómetros até Espinho, onde encontraríamos a EM555, eram a descer e por estranho que pareça foram muito difíceis. Sem tempo para reaquecer os músculos, o vento fazia-nos tremer de frio por todos os lados, pelo que foi um alívio quando voltámos a subir já perto da EM555, que nos conduziu a bom porto, que é como quem diz à Lousã, onde tomámos um banho quente na Pousada, previamente tratado pelos outros quatro elementos, que entretanto já tinham jantado e partido da Lousã, não sem antes nos ligarem apara saberem como estávamos e nos darem as indicações necessárias para referirmos na Pousada.

Eram 21:13 quando largámos definitivamente as bicicletas, com 97 quilómetros e 2700m de ascendente. A média geral foi ridiculamente baixa, mas não deu para mais.

O APRO seguiu directamente para Coimbra, mas nós os três ainda fomos jantar antes de iniciar a viagem para Lisboa, assim terminando “um dia épico de BTT” como foi várias vezes apelidado.

Faltou o bocadinho depois de Gondramaz, mas havemos de lá voltar com condições mais propícias para fazer o percurso todo. Obrigado a todos pela excelente companhia nesta aventura e em especial ao PC pelo trabalho da organização.

PL»